Morre Sebastião Salgado, o fotógrafo que retratou o Brasil para o mundo

Crédito, Getty Images
Morreu nesta sexta-feira (23/5) o fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado, na França. Ele tinha 81 anos e vivia em Paris.
"Durante mais de cinco décadas, Sebastião e sua inseparável companheira Lélia Wanick Salgado construíram uma obra fotográfica inigualável, com um conteúdo profundamente humanista e um olhar sensível sobre as populações mais desfavorecidas e os problemas ambientais que ameaçam nosso planeta", diz a nota da família sobre o falecimento do fotógrafo.
"Com Lélia, fundou o Instituto Terra, uma organização de reflorestamento em Aimorés, no estado de Minas Gerais (Brasil), que já plantou mais de 3 milhões de árvores. Por meio das lentes de sua câmera, Sebastião lutou incansavelmente por um mundo mais justo, mais humano e mais ecológico. Fotógrafo que viajou pelo mundo sem cessar, ele contraiu uma forma particular de malária em 2010 na Indonésia, como parte de seu projeto Gênesis. Quinze anos depois, as complicações dessa doença se transformaram em uma leucemia grave. Além de sua esposa Lélia, Sebastião deixa seus filhos Juliano e Rodrigo e seus netos Flávio e Nara."
Nascido no Vale do Rio Doce, no município mineiro de Aimorés, o estilo do seu trabalho é permeado por sua infância no Brasil rural.
Ao longo dos seus mais de 50 anos de carreira, Salgado alcançou fama internacional por suas extraordinárias composições em preto e branco, em que captava tanto as maiores belezas naturais, quanto as maiores atrocidades promovidas pelos homens.
"Sebastião foi muito mais do que um dos maiores fotógrafos de nosso tempo. Ao lado de sua companheira de vida, Lélia Deluiz Wanick Salgado, semeou esperança onde havia devastação e fez florescer a ideia de que a restauração ambiental é também um gesto profundo de amor pela humanidade. Sua lente revelou o mundo e suas contradições; sua vida, o poder da ação transformadora", diz a nota do Instituto Terra.
Criado por Salgado e sua companheira, Lélia, a ONG se dedica à recuperação e restauração do meio ambiente, em especial da Mata Atlântica.
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Economista de formação, Salgado começou a fotografar no início da década de 1970 na França, onde vivia desde então, e nunca mais parou.
Trabalhou para as agências Sigma, Gamma e Magnum. Atualmente, as fotos de Salgado fazem parte das coleções de numerosos museus e instituições importantes ao redor do mundo.
Era imortal da Academia de Belas Artes da França desde 2017. E recebeu os mais importantes prêmios da fotografia mundial. Dentre eles, o Prêmio W. Eugene Smith de Fotografia Humanitária, o World Press Photo, o Hasselblad, o prêmio Jabuti na categoria reportagem e foi o primeiro fotógrafo a receber o Príncipe de Astúrias das Artes, na Espanha.
Recentemente, o concurso Sony World Photography Awards 2024 premiou o fotógrafo brasileiro por sua "destacada contribuição à fotografia".
"Suas imagens, expostas em importantes instituições culturais e destacadas em publicações de todo o mundo, se transformaram em um símbolo do jornalismo fotográfico contemporâneo", escreve a Organização Mundial de Fotografia.
No ano ado, o The New York Times incluiu uma foto de Salgado em uma seleção com as "25 fotos que definem a idade moderna".
A imagem escolhida foi uma das que o fotógrafo fez em Serra Pelada, no Pará, em 1986, quando o local foi descoberto pelo garimpo, atraindo um formigueiro de gente.
"Um dos aspectos mais impressionantes das fotografias de Sebastião Salgado de uma mina de ouro a céu aberto no Brasil é a escala. Milhares de homens — com os corpos curvados e frágeis — são reproduzidos em miniatura contra o pano de fundo de uma enorme mina na terra", publicou o jornal.
O trabalho em Serra Pelada também lhe rendeu um livro, um dos muitos publicados pelo fotógrafo. Dentre eles Terra, Êxodos, Gênesis, Amazônia, Outras Américas de Da Minha Terra à Terra.
'Perdi um amigo': as despedidas de Salgado
Logo após a notícia da morte de Sebastião Salgado ser confirmada, as homenagens começaram a ser publicadas nas redes sociais.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) emitiu uma nota em que se diz "profundamente triste".
"Seu inconformismo com o fato de o mundo ser tão desigual e seu talento obstinado em retratar a realidade dos oprimidos serviu, sempre, como um alerta para a consciência de toda a humanidade", escreveu Lula.
"Salgado não usava apenas seus olhos e sua máquina para retratar as pessoas: usava também a plenitude de sua alma e de seu coração. Por isso mesmo, sua obra continuará sendo um clamor pela solidariedade. E o lembrete de que somos todos iguais em nossa diversidade."
A Academia de Belas Artes da França comunicou a morte de Salgado "com profundo pesar". A Agência Magnum publicou uma foto de Salgado em homenagem a ele, e outras autoridades lamentaram o falecimento do fotógrafo.
"Eu perdi um amigo. O Brasil perdeu um dos maiores expoentes da fotografia mundial. A morte de Sebastião Salgado deixa uma lacuna irreparável no jornalismo brasileiro", escreveu o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), em sua conta no X.
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, chamou Salgado de "grande artista" e "um dos patrimônios culturais brasileiros".
Barroso contou sobre um "episódio anedótico" baseado nas fotos de Salgado que existem no Supremo, duas delas, na sala do ministro. "Uma da Floresta Amazônica e a outra era uma canoa com dois indígenas de costas e nus. E era exatamente onde se tirava as fotos oficiais no meu gabinete. Um dia me dei conta de que todas as fotos oficiais tinham dois índios nus atrás. Aí pedi para colocar outra foto da Floresta Amazônica. Mas apenas para registrar que ele é tão querido e irado, que no gabinete do presidente do Supremo tem duas fotos dele. E espalhadas pelo Supremo tem muitas outras", contou o ministro, por meio de nota.

Crédito, Getty Images
A ministra do Supremo Cármen Lúcia também emitiu uma nota falando em uma "enorme perda para o Brasil e para essa humanidade tão precisada de grandes humanidades como o Tião. Sebastião era Salgado apenas no sobrenome: um ser humano a mostrar uma doçura total, mesmo nas denúncias fotografadas das indignidades e feridas do mundo."
"Sebastião Salgado fez de sua arte, a fotografia, um poderoso instrumento de denúncia contra a desigualdade. No Brasil e em todos os lugares do planeta que suas lentes alcançaram, fez o registro das injustiças, mas também mostrou a força dos mais fracos na luta coletiva pela vida e pela transformação. Foi um brasileiro que serviu ao mundo", escreveu a ministra-chefe da Secretaria das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT).
A ministra da Cultura, Margareth Menezes, emitiu uma nota dizendo que Sebastião Salgado "fez história com a arte de capturar questões sociais, culturais, ambientais e humanas.