Absorvente, calcinha ou coletor: qual produto menstrual é mais ecológico?

Coletor menstrual, OB, calcinha e absorvente lado a lado em superfície com tecido rosa

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Existem no mercado diversos tipos de produtos menstruais. Mas quais serão os mais seguros e sustentáveis?
  • Author, Ana Santi
  • Role, BBC Future

Durante uma viagem de fim de semana com minhas amigas, alguns anos atrás, uma delas mencionou que estava usando calcinhas absorventes, uma alternativa ecológica para substituir os absorventes descartáveis.

Eu já havia ouvido falar delas vagamente, mas não conhecia ninguém que as usasse. E sempre fui um pouco cética – será que elas seriam suficientemente absorventes?

Minha amiga me convenceu que sim. E, desde então, aderi às calcinhas absorventes.

Hoje, quando examino as gôndolas de produtos menstruais no meu supermercado local, fico impressionada com a quantidade de opções disponíveis – muitos absorventes internos e externos (alguns orgânicos, outros não), inúmeros tipos de coletores e algumas calcinhas absorventes.

Ainda assim, 49 bilhões de produtos menstruais descartáveis são consumidos todos os anos, somente na Europa. Nos Estados Unidos, cerca de 20 bilhões deles são descartados anualmente, gerando 240 mil toneladas de resíduos sólidos.

Em todo o mundo, os absorventes higiênicos descartáveis são o produto menstrual de uso mais comum. Eles contêm até 90% de plástico e a maioria acaba em aterros sanitários.

Por tudo isso, saí em busca de saber qual o produto menstrual mais sustentável disponível no mercado.

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Considerando que 1,8 bilhão de pessoas menstruam a cada mês em todo o mundo, um grupo de acadêmicos da França e dos Estados Unidos realizou uma avaliação do ciclo de vida de produtos menstruais.

Eles dividiram os produtos em quatro grupos: absorventes internos e externos descartáveis, orgânicos e não orgânicos (com aplicadores, no caso dos internos); absorventes reutilizáveis; calcinhas absorventes; e coletores menstruais.

Os coletores são feitos de borracha ou silicone macio e flexível e podem reter de 20 a 30 ml (cerca de duas colheres de sopa) de sangue menstrual. Leves e pequenos, podem durar até 10 anos.

A avaliação considera os impactos causados desde a fabricação até o descarte dos produtos, comparando oito indicadores de impacto ambiental: potencial de aquecimento global, uso de recursos fósseis, uso da terra, consumo de água, efeitos carcinogênicos, ecotoxicidade, acidificação e eutrofização – o aumento da concentração de nutrientes na água, que causa excesso de crescimento de plantas aquáticas.

O estudo durou um ano e foi realizado em três países – França, Índia e Estados Unidos.

Em todos os cenários e países, o coletor menstrual venceu com facilidade, seguido pela calcinha menstrual e pelos absorventes reutilizáveis. Em último lugar, vieram os absorventes descartáveis, internos e externos.

Os absorventes descartáveis, orgânicos e não orgânicos, apresentaram o maior impacto nos oito quesitos, exceto pelo consumo de água. E os absorventes não orgânicos foram avaliados com o maior potencial de aquecimento global e esgotamento de recursos.

O potencial de aquecimento global – a capacidade de emissão de gases do efeito estufa, que absorvem o calor e aquecem a atmosfera da Terra ao longo de um dado período de tempo – vem do processo de fabricação. Quase a metade desse impacto é decorrente da produção de polietileno, um tipo de plástico derivado do petróleo.

Mas um dos resultados mais surpreendentes, até para os autores do estudo, é que os absorventes de algodão orgânico apresentaram o maior impacto em cinco dos indicadores avaliados.

"Os impactos são principalmente relacionados à fabricação das matérias-primas e à produção orgânica, que pode causar impactos ambientais maiores", explica uma das autoras do estudo, Mélanie Douziech, da Escola Mines Paris da Universidade PSL, na França.

A produção da agricultura orgânica é menor do que a convencional. Isso significa que é preciso ter mais água e terra para produzir a mesma quantidade de algodão orgânico, em relação ao convencional.

Resultados similares foram encontrados entre os absorventes internos de algodão orgânico e não orgânico.

Anticoncepcional, OB e absorvente saindo de necessaire

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Todos os anos, são descartados 20 bilhões de produtos menstruais, somente nos Estados Unidos

Diferentes partes do ciclo de vida influenciam a quantidade de emissões, dependendo de cada produto.

"Para produtos descartáveis, a questão é a fabricação e a produção de matérias-primas, pois muitos desses produtos contêm plástico, que apresenta impacto bastante grande para o aquecimento global", explica Douziech.

"Com produtos reutilizáveis, a questão são as fases de fabricação e uso, especialmente o consumo de eletricidade."

Para lavar todos os produtos reutilizáveis entre cada uso, é preciso consumir água e eletricidade. Mas as calcinhas absorventes apresentam melhores resultados que os absorventes reutilizáveis – em parte, porque, de qualquer forma, seria preciso utilizar (e lavar) outro modelo de calcinha.

"O coletor menstrual é um claro vencedor, mas a calcinha menstrual também é uma alternativa que reduz muito os impactos ambientais", destaca Douziech.

O nosso cuidado com as calcinhas menstruais também pode influenciar o seu impacto final, se lavarmos em temperaturas mais baixas e como parte de uma carga total da máquina de lavar.

E o plástico?

A avaliação não considerou a poluição de plástico. Mas, segundo o estudo, cada absorvente convencional – incluindo a embalagem, abas e adesivos – libera cerca de 2 g de plástico não biodegradável para o meio ambiente.

Esta quantidade equivale a quatro sacolas plásticas e seu tempo de decomposição é estimado em 500 a 800 anos.

O estudo também destaca que, nos Estados Unidos, 80% dos absorventes internos convencionais e 20% dos externos são descartados no vaso sanitário, bloqueando os esgotos e liberando microplásticos para os oceanos.

Antes da publicação do relatório, o Programa Ambiental das Nações Unidas (UNEP, na sigla em inglês) encomendou, em 2021, uma análise de diversos estudos do ciclo de vida, comparando os impactos ambientais dos produtos menstruais, incluindo as emissões de carbono e o consumo de recursos.

Uma das autoras foi Philippa Notten, diretora da organização sem fins lucrativos TGH Think Space, com sede na Cidade do Cabo, na África do Sul. Ela se dedica a projetos de sustentabilidade, mudanças climáticas e consumo de energia.

Notten afirma que, devido à falta de dados, o impacto do plástico no fim da vida dos produtos menstruais não é bem documentado nas avaliações de ciclo de vida.

"O plástico costuma ser calculado como terminando em um aterro ou incinerador", explica ela.

"Ao contrário do que pode parecer, o aterro, na verdade, parece bom do ponto de vista de pegada de carbono. Isso porque o plástico leva centenas de anos para se degradar e essas emissões de carbono ficam presas no aterro, que age como sifão de carbono."

"Na verdade, este produto nem sempre acaba em um fluxo de gestão formal de resíduos; ele se transforma em lixo nas praias ou microplásticos no mar", prossegue Notten. "E ainda existe muito carbono na produção de plástico."

No relatório do UNEP, o coletor menstrual também aparece em primeiro lugar, com margem considerável.

"É muito raro que isso aconteça com um produto", prossegue Notten. "Não é que o coletor não tenha pegada de carbono, mas ele é um produto tão leve e pequeno que o impacto também é menor em relação aos demais."

"Sempre falamos nestes estudos em 'pontos de equilíbrio': quantas vezes você precisa usar um produto renovável para que ele compense as emissões causadas nas suas fases de fabricação e uso, em comparação com um produto descartável");