Como atletas da Ucrânia, potência nos Jogos Paralímpicos, treinaram em meio à guerra

Danylo Chufarov competindo no Campeonato Mundial de Natação do IPC de 2013, em Montreal.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, O nadador Danylo Chufarov sobreviveu a ataques com bombas em Mariupol
  • Author, Andy Swiss
  • Role, BBC Sport

"Eu estava pronto para morrer. A probabilidade de morrer era tão alta que você tinha que se conformar com isso.”

Em 2022, a cidade natal de Danylo Chufarov, Mariupol, estava sitiada. Por três semanas, enquanto as bombas caíam ao seu redor, ele sobreviveu com pouca comida, água da chuva e sem eletricidade.

A casa dele foi destruída, junto com a maioria de seus pertences. Ele não treinou por seis meses.

Mas, em 2023, tornou-se tricampeão mundial — com os melhores resultados de sua longa carreira na natação.

O atleta foi indicado ao conceituado prêmio Laureus, posando para fotos no tapete vermelho com o astro do tênis Novak Djokovic e o jogador de futebol do Real Madrid Jude Bellingham, um dos principais nomes da seleção da Inglaterra.

Agora, o nadador, que tem deficiência visual, espera se tornar campeão paralímpico.

"Podemos mostrar que estamos prontos para lutar", ele sorri.

"Meu país vai lutar no campo de batalha — e nós vamos lutar no esporte. Essa é a nossa missão."

Danylo Chufarov posando ao lado de Novak Djokovic.

Crédito, Divulgação

Legenda da foto, Chufarov posou, em abril, ao lado do tenista Novak Djokovic, dono de 24 títulos em Grand Slams
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O sucesso paralímpico da Ucrânia é um dos casos mais peculiares e surpreendentes do esporte.

Como regra geral, o quadro de medalhas dos Jogos Paralímpicos reflete em grande parte o dos Jogos Olímpicos.

Nos últimos Jogos Paralímpicos de verão em Tóquio, China, Grã-Bretanha, EUA, Rússia (competindo sob a bandeira do Comitê Paralímpico Russo) e Holanda foram as nações com melhor desempenho.

Um mês antes, todas haviam terminado entre as sete primeiras no quadro de medalhas Olímpico.

Mas o próximo país na lista paralímpica era a Ucrânia.

Os ucranianos ganharam 98 medalhas paralímpicas em Tóquio, ficando em sexto lugar.

Só que, nos Jogos Olímpicos, apenas algumas semanas antes, eles haviam terminado em 44º.

Isso está longe de ser um fato isolado. Na verdade, a Ucrânia pode reivindicar o título de nação paralímpica mais bem-sucedida de forma consistente do mundo.

Nos últimos dez Jogos Paralímpicos — incluindo as edições de verão e inverno — desde 2004, a Ucrânia terminou entre os seis primeiros em todos os quadros de medalhas.

Nenhum outro país no mundo conseguiu este feito.

Os ucranianos competiram nos Jogos de Inverno de Pequim 2022, apesar do seu país ter sido invadido apenas alguns dias antes.

Depois de uma viagem de quatro dias até Pequim, as imagens de seus atletas pedindo "paz para a Ucrânia" repercutiram em todo o mundo.

De alguma forma, eles terminaram em segundo lugar no quadro de medalhas, à frente de potências com tradição nos esportes de inverno como França, Canadá e Estados Unidos.

Atletas paralímpicos da Ucrânia protestando pela paz na Polônia ao voltar dos Jogos Paralímpicos de Inverno de 2022.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Os Jogos Paralímpicos de inverno de 2022 começaram pouco mais de uma semana após a invasão em larga escala da Ucrânia pela Rússia. Valeriy Sushkevych, presidente do Comitê Paralímpico, fez parte dos protestos da Ucrânia durante o evento

Os desafios que os atletas da Ucrânia enfrentam desde 2022 são muito grandes.

Chufarov diz que as sequelas do que vivenciou em Mariupol vão sempre acompanhá-lo.

"Perdi alguns quilos, mas isso não reflete meu estado mental quando deixei a cidade. Acredito que esse trauma vai ficar comigo para sempre", afirma.

Agora, ele treina em uma piscina perto de Dnipro. É uma das poucas instalações perto dele que não foram destruídas ou ocupadas pelo Exército russo.

No entanto, o local fica a menos de 160 quilômetros da linha de frente de combate.

"Há alertas de ataque aéreo o tempo todo", ele conta.

"Temos que fugir para os abrigos antiaéreos — e também há falta de eletricidade. Essas são as condições em que temos que treinar."

Os destroços carbonizados de um prédio em Mariupol.

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, O apartamento de Chufarov, em Mariupol, foi destruído por bombardeios russos

O homem por trás do sucesso extraordinário da Ucrânia é o presidente do Comitê Paralímpico, Valeriy Sushkevych.

Ele desenvolveu um programa chamado Invasport, que criou instalações especializadas em esportes voltados para pessoas com deficiência em todas as regiões do país.

Mas esta infraestrutura, como muitas outras coisas na Ucrânia, foi gravemente danificada.

De acordo com Sushkevych, 500 instalações esportivas para pessoas com deficiência da Ucrânia foram destruídas.

Ele descreve os preparativos para os Jogos Paralímpicos de Paris 2024 como "terríveis", com os atletas privados de sono por causa das sirenes de ataque aéreo que soam a noite toda.

"Há perigo físico de bombas e foguetes todos os dias, às vezes a cada hora", diz ele.

"De que tipo de preparação podemos falar quando as pessoas treinando ao ar livre veem foguetes voando — e sabem que esses foguetes estão voando para matar pessoas e matar seus parentes");